...Quem um dia irá dizer
Que existe razão
Nas coisas feitas pelo coração?
E quem irá dizer
Que não existe razão?...
Legião Urbarna- Eduardo e Mônica
Sabem o que eu acho o máximo? É a minha mãe, de quase 73 anos, ter um namorado!
Ela tem um relacionamento que na Holanda eles chamam de “Latrelatie”. Algo típico Holandês que quer dizer um relacionamento onde cada um mantém a sua casa e ficam para dormir um na casa do outro quando querem, sem obrigação, sem cobração, sem as dívidas alheias. Cada um mantém sua individualidade, suas coisas e só dividem o que é agradável. Ou seja, parece que, na velhice, o egoísmo e o companheirismo vão bem na mesma frase.
Minha mãe estipulou que no caso dela, o namorido só fica com ela durante o finde na casa dela, quando tem alguma festa ou férias conjuntas. Eles fazem passeios juntos, programinhas à dois, visitas à amigos, tudo numa boa... mas ela diz que isso é o máximo que ela aguenta. Ainda mais por que, de acordo com ela, os homens da geração dela sempre serão difíceis, ainda mais na velhice.
Sem falar que o namorido dela tem (muita) dificuldade de se adaptar à coisas para além da Holanda. O ‘mundo’ lá fora, ele só conhece pelas enciclopedias da estante da casa dele.
Eis que quando nós, as filhas, nos reunimos com a nossa mãe, por questão de costume, nós acabamos falando em Português na maioria das vezes. E querendo ou não, essa é uma das únicas oportunidades que temos de falar Português. Por que quase sempre tem um Holandês ou alguém por perto e nós, por questão de educação e respeito, falamos Holandês. E por isso é de revirar os olhos quando, nas poucas vezes que falamos a nossa língua, vem alguém dizer coisas como: “Vocês me dão dores de cabeça falando esse idioma!”... [Como se o Holandês também não desse! daaeh!]
Só para dar uma idéia, ele é um dos poucos Holandeses que eu conheço que nunca viajou para além das fronteiras Holandesas até seus 64 anos de vida. Dito isso, ele só viajou de avião quando ele começou a namorar a minha mãe. Sinceramente, isso é quase inacreditável e ele deveria ganhar uma medalha por esse mérito por viver num país que é menor que a Ilha do Marajó e sem nunca ter pulado a ‘cerca do quintal’ dele. Imaginem então, a dificuldade de adaptação que ele tem?! E atualmente, já batendo na casa dos 70?
A última vez que ele fez esse comentário eu disse para ele que ele deveria saber onde estava amarrando o burro dele quando ele aceitou a namorar uma estrangeira. Por mais que a minha mãe fale perfeitamente o Holandês, ela é Belga e morou 48 anos no Brasil, onde teve 4 filhos que nasceram e cresceram lá. Se adaptar na Holanda é uma coisa, querer apagar o passado de alguém é outra bem diferente. Coisas que a minha mãe já disse a ele, mas sabem como é, ele tem dificuldades de aceitar.
Sinceramente, isso deveria ser algo óbvio e transparente como a água. Quando você namora um(a) estrangeiro(a), ele(a) tem outra bagagem cultural, entre essas, um outro idioma. Se você não aguenta (escutar) outras línguas, por que então, dar esse tiro no próprio pé, não é mesmo?!
Deve ser como minha mãe diz: “Pau que nasce torto, cresce torto e morre torto”. Não será agora na velhice que alguém conseguirá mudar a mente (dele), ainda mais contra a vontade!
É por isso que eu acho que minha mãe está certíssima. Se não dá mais para se adaptar um ao outro e você não quer saber mais desse domínio antiquado, o melhor mesmo é ter um relacionamento onde você divide só o agradável. É o fim da solidão, por que você tem um companheiro e quando enche o saco, cada um pega a sua trouxinha e vai pra sua casinha. Tudo numa boa!
É!... Por que relacionamento por sí só já é difícil pacas, para que então complicar mais ainda, ainda mais na velhice, não é mesmo?!
7 comentários:
Sua mãe está certa! Não vejo na idade dela a necessidade de dividir casa e trapos com alguém, ainda mais se a pessoa em questão parece ser o oposto dela em muitas coisas ( sim, os opostos se atraem!) Então que ela seja feliz dessa maneira na companhia dele!
Isso é tudo aquilo que eu sonhava para a minha mãe (viúva há 13 anos!). Sempre digo a ela que precisava de um namorido para lhe fazer a vida mais feliz. Ainda mais que a sua menininha está longe... Mas é difícil para ela ultrapassar a educção lusa (mesmo com 38 anos de Brasil). Ainda pensei que a minha cunhada, que ficou viúva uma ano e meio antes (do meu irmão) fosse ser um incentivo, já que ela tinha apenas 32 anos. Mas... as duas se completam. Enfim... Fico feliz pela tua mãe.
Beijos
Adorei, coisa bem boa pra ela, ter alguém, mas ao mesmo tempo ter o espaço dela. E ela tah gostando da nova casa ? Beijocas.
Oi Ana,
Ela tá gostando sim! Mas, ainda não se acostumou por completo. Por ex., ela ainda não sabe de cor e salteado onde as coisas estão guardadas. Coisas desse gênero! :)
Isso mesmo, solidao e ruim mas aturar gente cheia de mania e pior ainda...melhor mesmo viver so os momentinhos especiais. Certissima sua mae.
bj
Olha, eu já penso de forma diferente. Já que tem tantas "coisas que incomodam", o fato desse senhor não se adaptar com uma outra cultura estrangeira, não entender português, entre outras coisas, pq então sua mãe resolveu namorar justamente ele??? Se sabia disso tudo, pq então? Se ela acha que "pau que nasce torto, morre torto", era só ter arrumado um outro companheiro mais mente aberta!
Mari Mello
Mari,
Por mais que eu não dei exemplos no post, ele tem sim um lado bom (como toda gente). E uma coisa eu acho que a minha mãe também tem razão, os homens da geração dela tem uma mentalidade beeeem diferente! Vejo isso no meu falecido pai (que admirava quem falava outras línguas, porém tinha outros defeitos da mesma geração que é um tanto quanto machista), também vejo isso no meu sogro (que não sabe dar valor ao trabalho doméstico), vejo isso em muitos outros homens daquela geração que acha que a mulher é para lhe servir, seguir... Mudar de um para o outro, infelizmente, não muda a mentalidade.
E se já é difícil mudar, se adaptar a alguém na juventude, imagine na velhice??!
Por isso que eu acho 'latrelatie' a solução para solidão e não vejo absolutamente nada contra isso!
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