Não é verdade dizer que eu tenha talento para tudo e que tudo o que eu faço seja perfeito. Não é. Nem que eu quizesse. Não é.
Nem mesmo naquilo em que eu me sobresaio como o meu trabalho, os idiomas, os bolos... Se você olhar de perto, você vai ver que não existe perfeição. Existe sim, exigência e ambição. Não vou mentir. Ambiciono a perfeição, não por que eu acredito em perfeição, mas sim, por que sei que o resultado será num nível que eu me contento e pela consciência que eu fiz o meu melhor, mesmo naquilo que eu não tenho talento, eu sou, como diria Betinha, muito exigente de mim mesma.
Vejam bem, hoje em dia eu sei que eu não seria feliz se eu fosse jornalista. Por mais que eu goste de escrever, eu não tenho o talento de escrever que é preciso para ser uma boa jornalista. Eu tenho uma amiga em Recife que eu diria, ela sim, tem talento para escrever. Ela sim é uma jornalista. E eu tenho plena consciência que eu nunca iria conseguir escrever no nível dela. Acho isso fácil e óbvio de se ver. Basta também olhar para o mundo bloguístico. Acho meu blog legalzinho, volta e meia escrevo um post mais elaborado e geralmente contando uma história de algo que viví ou ví passar de perto, mas meu blog nunca será para discutir assuntos polêmicos com argumentos devidamente citados, nunca será o melhor, mega-popular ou super-interessante. Meu blog nunca será ótimo. Por aí há muitos outros blogs melhores que o meu, por que seus donos escrevem muito melhor do que eu. Mas também, isso nunca foi a motivação atrás do meu blog. No meu caso, é puramente vontade de escrever, registrar o momento, um pensamento e nada mais do que isso. É light, é passatempo. Não é revolucionário ou qualquer coisa parecida. É para (meu próprio) divertimento. E talvez, essa seja a única razão de sua existência. Por que, como eu já disse antes, no aspecto de escrever tem gente por aí muito mais talentosa do que eu.
Acho que a primeira vez que eu descobrí que eu não tinha talento para algo foi quando eu trabalhava como garçonete. Veja bem, para ser realmente um bom garçon ou garçonete exige talento, sim. Quem pensa que é para qualquer um, está enganado. Todo mundo nota isso quando vai a um restaurante. Se o serviço é bom, todo mundo exalta, se o serviço for ruim, todo mundo reclama. Eu mesmo deixo de ir num restaurante se o serviço for ruim. Você não?!
Eu fui garçonete durante 3 anos num restaurante grego. Levei um ano para realmente entrar na ginga. Ter controle de tudo, saber como tudo funcionava, aprender a gravar os pedidos (e suas exceções e substituições!) de várias mesas numa tacada só, carregar vários pratos de uma vez nas duas mãos e manter o equilíbrio. Aprender sobre as bebidas alcóolicas e seus devidos copos, taças e medidas. Saber o cardápio de cor e salteado, como eram servidos e preparados, seus preços e fazer contas gigantescas com gente falando alto, escutando Sirtaki e prestando atenção na campaínha da cozinha para apanhar os pratos quentes para a próxima mesa. Quem pensa que é fácil, se engana arredondamente. Só não é realmente difícil, obviamente, para quem já tem o talento nato. E como eu estava dizendo, isso não era bem o meu caso.
No entanto, eu tinha um colega, o Antoine (pronuncia-se “ãn-tu-ãn”), que era um desses talentos natos. Ele era excelente, super-carismático e gente fina. Eu só me tornei uma garçonete melhor por causa dele. Ele me ajudou e juntos acabamos formando um time forte, ou melhor, uma dupla forte. Éramos como ‘Leandro e Leonardo’, sendo que eu era o Leandro e ele o Leonardo... A gente ‘se completava’ e tinha cliente que notava e achava engraçado. A gente tirava sarro um com o outro e quando a gente notava que uma mesa estava num clima de diversão, a gente, para agradar os clientes, fícavamos brincando de disputar pela mesa. Nosso jeito rendeu até convite para irmos a festa de aniversário do cliente após o trabalho.
Mas, para além dos clientes legais, o nosso companheirismo servia também para os clientes chatos, bêbados e abusados. Quando tinha uma mesa que preenchia um desses quesitos, o Antoine tomava conta, e me tirava do sufoco. É..., é como eu disse, o cara era gente-fina assim. E quando ele tinha algum problema, eu quebrava o galho pra ele também.
Mas, enfim, eu só me tornei uma boa garçonete mesmo, quando trabalhávamos juntos nos fins de semana. Trabalho de equipe sempre foi algo em que me sobresaí, mas quando eu tinha que trabalhar no restaurante sozinha – de abrir a fechar – nas quartas-feiras e eu era a única garçonete, o chefe muitas acabava ajudando. Era estresse, cansativo e parece que as minhas pernas eram curtas demais para correr o restaurante inteiro. Já disse, eu não tinha/tenho talento para ser garçonete. Já o Antoine trabalhava sozinho as segundas e terças, abria, fechava o restaurante com um sorriso no rosto e sem ajuda do chefe..
E sério, depois de 3 anos eu já estava tããão cansada do trabalho, das briguinhas da comunidade grega, da comida, de não ter folga nos findes, de ter dificuldade para conseguir folga e férias (os gregos do restaurante tinham direitos de férias acima de nós), que se aquilo não é algo que você goste mesmo, que você tenha o talento, você acaba jogando a toalha no ringue. Para começar eu precisava daquele emprego para pagar as minhas contas, mas nunca foi uma carreira que eu pretendia seguir. Era uma necessidade e eu me esforcei ao máximo para me tornar o melhor que eu pude até que eu conseguí. Mas, talento?...Não, não era ‘mijn ding’ (a minha ‘praia’)...
O Antoine ainda ficou mais alguns anos. Ele não só tinha o talento, ele gostava! Ele era o caçula duma família onde o pai e os 2 irmãos dele trabalhavam no ramo de HORECA (Hotel Restaurante e Café) e a mãe dele ainda tentou proíbir o Antoine de seguir a mesma profissão. A mãe dele estava cansada de passar as noites dos findes sozinha em casa. [É, isso também acontece por aqui da mãe querer proíbir a escolha do filho...] Ele até entrou para um curso de Política na Universidade e tirava ótimas notas, mas o coração dele estava alí, num restaurante.
Resultado: ele saiu de casa, foi morar num quarto alugado, largou o curso da universidade, pediu demissão do restaurante grego e conseguiu emprego num restaurante chique da cidade. Pelo que eu entendí, é bem pago e feliz.
E isso me põe a pensar. Eu acho que você só consegue ser feliz (profissionalmente) na vida se você consegue descobrir o seu talento. A pergunta é: Como ficam aqueles que nunca descobrirão o seu talento? Esses fazem o quê?...
2 comentários:
passam a vida dos meios termos... meio satisfeito, meio estressado, meio decepcionado, meio feliz...
sortudos aqueles que reconhecem seu talento a tempo!
A Paula falou tudo. Tambem acho que sao sortudos quem tem a nocao clara do seu talento porque acho tao dificil descobrir...uma coisa e gostar de algo outra e ter talento.
Ju
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